Porque as palavras ganham asas...

                                                                          As Palavras

As palavras ganham asas

E é provável que voem

No azul, até ao infinito.

As palavras rasam a verdura

Dos prados e mergulham fundo

Em lamas espúrias.

Algumas, porém, anoitecem...

Como se uma ave

Me sangrasse na mão

Uma pedrada.

                                                                                   Edgardo Xavier



E porque é quase Natal...

          


                                                                (Sugestão de leitura e ilustração de Henrique Ferreira, 8ºVB

O sorriso


 

Dentro da barriga da mãe, o Menino Jesus ouvia, lá fora, São José dizer para Nossa Senhora:

            “Demorará a nascer?”

            E Nossa Senhora respondendo:

            “Não, tenho quase a certeza de que nasce esta noite.”

            Inquieto, o Menino Jesus perguntava-se se falariam de si. E o que quereria dizer “nascer”? Teria ouvido bem?

            O barulho do coração da mãe batendo com força perto do seu não deixava o Menino Jesus ouvir perfeitamente o que se passava lá fora. Escutava o sussurro de vozes, os passos de São José andando de cá para lá no estábulo, o roçar das roupas de Nossa Senhora na barriga, mas nem sempre tinha a certeza daquilo que ela e São José diziam porque ainda não compreendia muitas palavras.

            Algumas palavras compreendia, a palavra “mãe”, a palavra “coração”, a palavra “alegria”. Quando, por exemplo, a mão da mãe acariciava levemente a barriga e o tocava através da pele, experimentava uma sensação vibrante e nova que nunca antes, no Céu, quando ainda não era homem, sentira. Então, o seu sangue corria mais depressa e sentia as faces a ruborizarem-se-lhe. Estava certo de que “alegria” era isso. (…)

            “Estou a sentir dores, acho que vai nascer.”

(…) Mas que queria dizer “nascer”? (…) De repente sentiu-se puxado para baixo por uma força irresistível. (…) Fechou os olhos e deixou-se escorregar docemente para fora da mãe.

            Quando os abriu, o rosto da mãe sorria debruçado sobre o seu, muito perto do seu, e o Menino sentiu, apesar do frio que fazia, um calor denso e vibrante inundá-lo e aquecer todo o estábulo. “Nascer deve ser isto…”, pensou. E, cheio de alvoroçado contentamento, estendeu o braço, tocou levemente com o dedinho indicador o rosto de Nossa Senhora e sorriu também.

                                                 in O cavalinho de pau do Menino Jesus e outros contos de Natal,               

                                                                                             de Manuel António Pina



Se eu fosse um pássaro azul...


Se eu fosse

Um pássaro azul,

Voava sobre Portugal,

De norte a sul.

 

Se voasse sobre Portugal,

Voava, também, sobre a América,

A Ásia e a África.

Ficaria histérica!

 

De Portugal à Austrália,

E sempre no meu bico,

Levaria uma Dália.

 


Voaria, voaria,

Como um avião.

Faria ninho

Num galho de Chorão.

 

Quando chegasse ao Polo Norte,

Vestia um casaquinho,

Pois era bem provável

Que estivesse friozinho.

 

Agora acordei

Do meu lindo sonho azul,

O pássaro esvaiu

E nem sequer estou no sul!

 

                              Filipa Dias, 6ºVA