Porque as palavras ganham asas...
As Palavras
As palavras ganham asas
E é provável que voem
No azul, até ao infinito.
As palavras rasam a verdura
Dos prados e mergulham fundo
Em lamas espúrias.
Algumas, porém, anoitecem...
Como se uma ave
Me sangrasse na mão
Uma pedrada.
Edgardo Xavier
O sorriso
Dentro
da barriga da mãe, o Menino Jesus ouvia, lá fora, São José dizer para Nossa
Senhora:
“Demorará a nascer?”
E Nossa Senhora respondendo:
“Não, tenho quase a certeza de que
nasce esta noite.”
Inquieto, o Menino Jesus
perguntava-se se falariam de si. E o que quereria dizer “nascer”? Teria ouvido
bem?
O barulho do coração da mãe batendo
com força perto do seu não deixava o Menino Jesus ouvir perfeitamente o que se
passava lá fora. Escutava o sussurro de vozes, os passos de São José andando de
cá para lá no estábulo, o roçar das roupas de Nossa Senhora na barriga, mas nem
sempre tinha a certeza daquilo que ela e São José diziam porque ainda não
compreendia muitas palavras.
Algumas palavras compreendia, a
palavra “mãe”, a palavra “coração”, a palavra “alegria”. Quando, por exemplo, a
mão da mãe acariciava levemente a barriga e o tocava através da pele,
experimentava uma sensação vibrante e nova que nunca antes, no Céu, quando
ainda não era homem, sentira. Então, o seu sangue corria mais depressa e sentia
as faces a ruborizarem-se-lhe. Estava certo de que “alegria” era isso. (…)
“Estou a sentir dores, acho que vai
nascer.”
(…) Mas que queria dizer
“nascer”? (…) De repente sentiu-se puxado para baixo por uma força irresistível.
(…) Fechou os olhos e deixou-se escorregar docemente para fora da mãe.
Quando os abriu, o rosto da mãe
sorria debruçado sobre o seu, muito perto do seu, e o Menino sentiu, apesar do
frio que fazia, um calor denso e vibrante inundá-lo e aquecer todo o estábulo.
“Nascer deve ser isto…”, pensou. E, cheio de alvoroçado contentamento, estendeu
o braço, tocou levemente com o dedinho indicador o rosto de Nossa Senhora e
sorriu também.
in O cavalinho de pau do Menino Jesus e outros contos de Natal,
de Manuel António Pina
Se eu fosse um pássaro azul...
Se eu fosse
Um pássaro azul,
Voava sobre Portugal,
De norte a sul.
Se voasse sobre Portugal,
Voava, também, sobre a América,
A Ásia e a África.
Ficaria histérica!
De Portugal à Austrália,
E sempre no meu bico,
Levaria uma Dália.
Voaria, voaria,
Como um avião.
Faria ninho
Num galho de Chorão.
Quando chegasse ao Polo Norte,
Vestia um casaquinho,
Pois era bem provável
Que estivesse friozinho.
Agora acordei
Do meu lindo sonho azul,
O pássaro esvaiu
E nem sequer estou no sul!
Filipa Dias, 6ºVA