Palavras (des)confinadas...

 Neste início de ano tão atípico, partilhamos convosco dois textos - pensados, sentidos, registados em palavras (des)confinadas. Obrigada, Francisca. Obrigada, Ana Rita. Não deixem de escrever. 


        Esta será a provavelmente a única vez que falarei assim tão abertamente sobre este assunto. Esta história, relato, ou como lhe quiserem chamar, passou-se há cerca de seis anos.

        Eu sempre fui muito ligada a todos aqueles que me querem bem. E, como tal, nunca fui capaz de me imaginar sem eles. A minha avó foi sempre aquela pessoa que me apoiou em tudo, esteve sempre presente, tal como está neste momento, está dentro de mim.

        A minha avó era a pessoa mais bela, nunca a vi sem a sua sombra negra, que lhe destacava aqueles olhos verdes, ou sem o seu cabelo perfeitamente apanhado. Aprendi tanto com ela! Nomeadamente sobre “ser uma lady”, era como ela dizia. Sempre que saio de casa sem me arranjar, oiço a sua doce voz:

       - Francisca, sê sempre bela, olha para a vovó! – E dava a sua voltinha teatral, que eu dava tudo para voltar a ver.

       A nossa última conversa foi o momento mais marcante da minha vida. Como era habitual, aos sábados ia com ela fazer as suas unhas:

        - Avó, posso fazer as unhas como as tuas? – perguntei.

        Com um entusiasmo, que foi digno até de palmas, ela disse:

         - Claro, meu amor, estive sempre à espera que mo pedisses.

         Passamos a manhã no salão, saímos de lá como novas. Quando íamos almoçar tive a necessidade de me abrir com ela:

          - Avó, é verdade que um dia me vais deixar?

        - Francisca, meu amor, a avó vai estar sempre presente! - e cortou essa conversa por aí. Nunca entendi o porquê de ela não me falar sobre isso, até hoje.

        Hoje, de prenda de aniversário, recebi a carta que ela tinha escrito. Chorei, sorri e relembrei, nomeadamente a história que acabei de contar. “Vou estar sempre presente”, começou ela, e por entre gargalhadas e lágrima terminou com “ O mundo é teu, pequena”.

            Não ficou nada por dizer, mas havia muito para contar.

                                                                                                                      Francisca Torres, 9ºVB



O amor dentro de uma garrafa

    Num dia bastante ensolarado estava sentada com a minha avó a ver o pôr-de-sol. O mar estava calmo e fazia música quando batia ligeiramente nas rochas. Aquela belíssima paisagem era como uma atuação da natureza para alguém sem identidade.

    Mais tarde, com a maré a baixar, perto da costa vi uma garrafa de vidro meia coberta pela areia. No início, tive receio de me aproximar, mas quando prestei atenção vi que tinha um papel e parecia ter algo escrito. Peguei nela, fui ter com a minha avó e mostrei-lhe o que tinha encontrado.

     Abrimos e li o que lá estava, mas as palavras estavam cortadas pela metade. Estava escrito de uma maneira que não entendia: era uma letra estranha e o papel estava escuro, gasto. Parecia que muitos anos tinham passado por ele. Entreguei-o à minha avó. O rosto dela transmitia vários sentimentos ao mesmo tempo, de tal forma que não dava para entender ao certo. Questionei o porquê de várias expressões sentimentais e perguntei. Disse-me que era uma carta que esperava há muito tempo do seu amado que há muitos anos teve de partir para longe. Na carta estava escrito:

   “Meu amor, temo trazer uma notícia má, aquela que só no momento nos faz perceber que a vida só é importante com os que mais amamos e como é bom aproveitá-la. Posso dizer que estou a morrer, tenho dias até conhecer um outro mundo. Aproveitei e escrevi esta carta antes que fosse tarde demais. Minha querida Ana, penso que não é esta doença que me leva, mas sim a saudade de ti. Não chores. Se sentires a minha falta sorri quando olhares para uma foto ou quando tiveres alguma lembrança nossa. Amo-te, Ana, até um dia, minha querida….”

    Nesse momento não sabia o que dizer, o sentido de enviar a garrafa pelo mar era por ser uma memória das suas infâncias, pois faziam o mesmo no rio para se comunicarem. Era um gesto romântico, o amor entre os dois era repleto de memórias de felicidade.

                                                                                                                       Ana Rita Rocha, 9ºVC


Sem comentários:

Enviar um comentário